"Quando criamos um filme, ele é feito numa linguagem que não consiste apenas em palavras, mas também na maneira em que ela codifica nossa percepção do mundo, nosso entendimento dele."
Andrzej Wajda Estamos terminando o ano com mais uma grande perda para o cinema: o incomparável diretor polonês Andrzej Wajda. Nascido em seis de março de 1926, em Suwalki, na Polônia, tornou-se não só um diretor cinematográfico, mas também teatral, além de talentoso roteirista e cenógrafo. Certamente, um dos mais relevantes criadores de sua geração (em 2000 recebeu da Academia um Oscar honorário pelo conjunto de sua obra). Wajda morreu no último nove de outubro. Seu monumental legado compreende quase quarenta filmes, que vão desde massivas produções que tratam de crises políticas e sociais, até dramas intimistas, reflexivos, com uma análise contemporânea da vida em seu país. Sempre às voltas com a censura, Wadja promoveu uma verdadeira catarse nacional ao retratar complexas questões da história polonesa e, no processo, exorcizar seus próprios demônios. Há de se mencionar que o pai do diretor, um oficial polonês na Segunda Guerra Mundial, foi morto pelas forças soviéticas no infame massacre de Katyn, título de um dos mais conhecidos filmes do polonês, datado de 2007. Os horrores da guerra são constantes no trabalho do diretor, além da política propriamente dita. Os emblemáticos Geração (1955), Kanal (1957) e Cinzas e Diamantes (1958), primeira de suas duas trilogias, retratam a vida na Polônia durante a Segunda Guerra Mundial, entretanto, têm em seu DNA a discussão das problemáticas trazidas pelo falecimento de Stalin em 1953, bem como a exposição e denúncia dos excessos políticos do regime comunista contra aqueles que a ele se opunham. É um cinema de coragem que não está comprometido com ideologias partidárias, mas sim com a liberdade de seu país, seja de expressão, seja política. O anseio a essas liberdades é o tema central de outra importante trilogia, composta pelo O Homem de Mármore (1977), O Homem de Ferro (1981) e Walesa (2013). Os protagonistas de suas películas comumente são focados à luz de importantes acontecimentos políticos e sociais, consubstanciando-se em heróis trágicos sempre em conflito, que frequentemente sucumbem às pressões da história. Podemos dizer que o cinema de Wadja é profundamente impregnado de humanismo, vez que para ele o indivíduo vem antes do coletivo. Os dramas pessoais têm mais relevância que a guerra. É justamente essa perspectiva que dá a seus filmes longevidade artística, convidando o público a novas análises e avaliações. Sua ênfase na reconstrução cinematográfica da história da Polônia (e vida contemporânea), com frequência, originou caloroso debate, tanto nacional quanto internacionalmente, tendo papel importante na visão do mundo sobre o país. As liberdades artísticas tomadas pelo diretor na película Danton (1981) renderam várias críticas negativas dos franceses, que viram na produção mais uma alusão ao país de Wadja do que à revolução francesa, por exemplo. Inegável que seus filmes abriram os olhos de uma geração tanto de cineastas como de espectadores, por seus temas e também por sua forma, com ênfase no uso de cores, imagens, sons e ritmo. O trabalho de Wadja é influenciado, num primeiro momento, pela denúncia social do neorrealismo italiano e, num segundo, pela liberdade artística da Novelle-Vague francesa. Andrzej Wajda fez história na Polônia e no mundo. E não apenas como cineasta, mas como verdadeiro agente político. Vale mencionar que de 1989 a 1991 Wajda foi eleito Senador da República da Polônia. De 1992 a 1994 ele foi membro do Conselho Presidencial da Cultura. Em 1994 ele fundou na Cracóvia o Centro de Arte e Tecnologia Japonesa, sendo-lhe concedida a Ordem do Sol Nascente no Japão no ano seguinte. Wajda ocupou a presidência da Associação de Filmes Poloneses de 1978 a 1983. Foi também membro do "Conselho Solidário" de Lech Walesa (1981-1989). Filmes são poderosos e Wadja, armado de sua câmera, promoveu uma verdadeira revolução nas mentes de seus compatriotas. Sua filmografia é o atestado de uma mente questionadora, desafiadora e irrequieta, essencial para a compreensão da evolução (ou involução) política do comunismo e de seus efeitos no homem moderno. Seu último filme, a ser lançado postumamente, Powidoki, que narra os últimos anos de vida do pintor de vanguarda Wladislaw Strzeminski e sua luta contra o stalinismo, foi concluído neste ano e já sai como candidato ao Oscar pela Polônia. Gianfranco Marchi
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AutoresGianfranco Marchi Histórico
Fevereiro 2022
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