Nelson Marques Cineclube Natal e ACCiRN – Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Norte e-mail: [email protected] Dados de 2015 mostram que a Nigéria, país da África Ocidental, situado no Golfo da Guiné, e composto de 36 Estados e um Território Federal (Abuja é a sua capital), através de seu polo produtor de cinema - Nollywood - obteve o 1o. lugar no mundo na quantidade de filmes produzidos, fazendo com que ele tenha o 3o. maior faturamento do mundo relacionado com cinema (atrás apenas de Hollywood, EUA e Bollywood, Índia). Nessa produção, são empregados mais de 1 milhão de pessoas (numa população de 195,8 milhões, segundo dados de 2018), formando uma massa de empregos que é a segunda do país, perdendo apenas para a agricultura. Ele é o 4o. setor econômico mais importante do país contribuindo com 5% do PIB da Nigéria (que é de 397,3 bilhões de dólares). Nollywood produz uma média de 1.500 filmes por ano (cerca de 15 vezes a produção cinematográfica brasileira). São certificados pelo "National Censorship Board" cerca de 125 filmes por mês. É a única fonte oficial de informações, responsável pela classificação indicativa dos filmes e, por isso mesmo, não muito confiável. O que significa que a produção real é muito maior do essa. Nollywood faz um cinema que procura dar conta das diversas tradições e estilos de vida existentes num país que possui quase 200 milhões de habitantes, divididos em cerca de 389 grupos étnicos (29% de haúças, 20% são igbos e 20% de iorubás), que falam cerca de 250 idiomas. O fenômeno do cinema nigeriano tem raízes na década de 1980, quando a violência começou a afugentar o público dos cinemas e as pessoas "preferiam" ficar em casa. É preciso lembrar que a Nigéria havia adquirido sua independência do Reino Unido apenas cerca de 20 anos antes, em 1o. de outubro de 1960. Com as pessoas em casa e com a força do então nascente mercado de vídeo-cassete, mesmo que no início ainda para uma elite econômica local, se explica o desenvolvimento acelerado deste meio de se fazer e divulgar cinema. Do apenas assistir fitas em betacam e VHS (de início importadas ou pirateadas), paralelamente, se começou a contratar serviços de produção de filmagens de eventos pessoais, como casamentos, formaturas, aniversários e enterros. Esses filmes "pessoais" também passaram a ser exibidos para amigos e convidados. Com isso, a "indústria" de produção de vídeos "caseiros" passou a diversificar com filmagens também de peças teatrais. Daí para a produção de filmes com os atores, atrizes e diretores das companhias de teatro, foi um pequeno passo. A produção cinematográfica propriamente dita, no entanto, na forma de um mercado quase caseiro de fitas cassete (hoje, com a redução dos custos da tecnologia digital, os filmes são na sua grande maioria em mini-DV), é comumente creditada ao início dos anos 1990, quando a ausência total de salas de cinema e de incentivos e financiamento paralisou completamente a ainda incipiente indústria cinematográfica nacional. A partir daí, a produção televisiva se fortaleceu e as séries locais viraram um fenômeno de audiência, com seus atores ganhando prestígio nacional. E assim nasceu... a Nollywood como a conhecemos hoje! Ainda em meados daquela década as produções em formato digital proliferam em uma escala sem precedentes. Desde então, a cada semana são produzidos cerca de 30 filmes. A produção é realizada em diferentes línguas, assim como acontece com as produções de Bollywood, na Índia. Cerca de 40% é em pidgin nigeriano (o inglês local), 35% em iorubá, 17,5% em haúça e os 7,5% restantes em outras línguas e dialetos locais. Uma produção média de Nollywood é realizada em cerca de 10 dias e custa aproximadamente 15 mil dólares. Estima-se que cada filme venda cerca de 25.000 cópias em 10 dias, cada uma delas por 2.300 nairas, a moeda nigeriana (o equivalente a cerca de 3,50 dólares). Ou seja, metade do custo de um filme se paga nos primeiros 10 dias. Outro retorno vem como parte do aluguel das videolocadoras cujo custo é de 200 nairas por fita ou DVD, o equivalente a 0,30 centavos de dólar americano. A margem de lucro dos produtores é modesta, mas jogam mais na quantidade do produto vendido do que no preço. Com esse espírito de comercialização, o mercado cinematográfico nigeriano cresceu, em cerca de 15-20 anos, do zero a cerca de 250 milhões de dólares por ano. Na atualidade há cerca de 300 diretores em atividade produtiva. A maior parte dos estúdios estão sediados nas cidades de Lagos e Enugu. Estes filmes são lançados diretamente em locadoras, cineclubes (há cerca de 15.000 deles) e mercados das cidades e nos mais variados tipos de comércio. Quase que imediatamente, ao lado desse comércio legalizado, há o comércio da pirataria que se apropria dos lançamentos em menos de uma semana (daí a necessidade de uma produção contínua de novos filmes). Os preços das cópias e locações são compatíveis com os preços do mercado pirata na tentativa de poder competir de igual para igual, mas mesmo assim a pirataria é, também, um problema grave na Nigéria. A ânsia por imagens e enredos comuns e familiares por parte dos nigerianos fez com que os filmes fossem consumidos, no início, mesmo sem grandes qualidades técnicas. Mas ganhavam o público por apresentarem uma estética e linguagem próxima da realidade local. As produções de Nollywood são os exemplos mais bem sucedidos de auto representação no cinema africano. Desde o fim da colonização a Nigéria, e a maioria dos outros países da África lidaram, e lidam ainda hoje, com a necessidade de restabelecer sua sociedade. Não apenas no que tange à política e à economia, mas também à cultura, tradições e a religiosidade, aspectos esses que foram afetados, quando não estrangulador, com o domínio europeu. Filmes e Diretores A oferta de filmes nigerianos no Brasil é pequena. São difíceis de encontrar nos cinemas brasileiros e também no mercado de dvd's, mesmo que em versões piratas. Em 2012, no mês de novembro, na sala de exibições da Caixa Cultural, no Rio de Janeiro, houve a programação da Mostra Nollywood - O Caso do Cinema Nigeriano, com exibição de filmes, promoção de debates e de conferências. Foram cerca de 12 filmes, alguns deles nunca exibidos no Brasil, mostrando diversos exemplos de filmes desde 1992 até os de produção mais recente à época (2011). Os títulos e seus diretores, alguns deles marcando presença no Brasil pela primeira vez, foram: "Living in Bondage", o primeiro blockbuster nigeriano, de 1992, de Chris Obi Rapu, "Ti Oluwa Ni", 1993, de Tunde Kelani, "Mortal Inheritance," 1995, de Andy Amenechi, "Domitila", 1996, de Zeb Ejiro, "Issakaba", 2001, de Lancelot Oudua Imasune, "Tango with Me", 2011, de Mahmood Ali Balogun. Outros nomes mais conhecidos são: "Aki na Ukwa", de 2002, de Amayo Uso Phillips, "Ousofia in London", 2003, de Kingsley Ogoro, "Emotional Crack", 2003, de Lancelot Imasuem, "Check Point", 2006, de Bond Emeruwa, "The Figurine: Araromire", 2009, de Kunle Afolayan. Atores e Atrizes Dentre os mais conhecidos e famosos podemos citar: Funke Akindele, Chinedu Ikedize, Eniola Badnius, Paira Iheme, Patience Ozokwon, Victor Osuagwu, Chiwetalu Agu, John Okafor, Nafisa Abdullahi, Regina Askia, Iria Edo, Hadiza Gabão, Iyabo Ojo, Yrel Edochie, Chioma Chukwuka, Lola Oyewo, Alex Ejubo. Disseminação dos filmes Além da venda direta efetuada pelos produtores e diretores, e dos próprios artistas, e pela venda das cópias piratas, há outras formas de disseminação dos filmes:
Aos interessados no polo Nollywood há vários documentários realizados desde 2007, sendo o mais recente de 2020. O primeiro, com 55 minutos, foi dirigido por Franco Sacchi em 2007, nos EUA, de título "This Is Nollywood". Foram seguidos por "Welcome do Nollywood", também de 2007, com 58 minutos, realizado por Jamie Meltzer, nos EUA também. Em 2008, Ben Addelman e Samuel Mallal realizaram no Canadá o "Nollywood Babylon", com 74 minutos de duração, enquanto o diretor francês Julien Hamelin realizava o seu doc "Nollywood, le Nigeria fait son cinema", na França, em 2009. Mais recentes, são os documentários de 2016 e 2020, realizados na Nigéria e na Alemanha, respectivamente, por Tope Oshin e Johannes Preuss. O de Tope, com 41 min, é "Amaka's Kin: The Women of Nollywood". O de Preuss, com 65 min, é "Nollywood - Filmbusiness African Style".
0 Comments
Leave a Reply. |
AutoresGianfranco Marchi Histórico
Fevereiro 2022
Categorias |