Nelson Marques Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Norte (ACCiRN) e Associação Cultural Cineclube Natal e-mail: [email protected] Terra à Deriva (Liu Lang Di Qiu, The Wandering Earth) é um filme chinês de ficção científica realizado em 2019, dirigido e roteirizado, por Frant Gwo e falado em mandarin e inglês numa voz eletrônica. Frant Gwo é o responsável, também, por outros três filmes, Lee´s Adventure, de 2011, My Old Classmate, de 2014 e The Sacrifice, de 2020. O filme é uma adaptação para o cinema do conto “The Wandering Earth” (Terra Errante) do escritor chinês Liu Cixin, escrito em 2000. O filme foi realizado com um orçamento de 50 milhões de dólares americanos e arrecadou até o momento mais de USS 700 milhões, só na China. Está sendo, até o momento, o segundo filme de maior arrecadação de bilheteria na China, incrivelmente num gênero dominado pelo cinema americano. E competem com eles com muita seriedade e profissionalismo. Liu Cixin (nascido em 1963 em Yangquan, província de Shanxi), é um escritor chinês de ficção científica hard. Ele já foi premiado por nove vezes (entre 1999-2006 e em 2010) com o Prêmio Yinhe (Galaxy), o prêmio de maior prestigio literário de ficção científica da China, e foi também vencedor do Prêmio Hugo de Melhor Romance, um dos prêmios de maior prestígio da literatura de ficção científica mundial, em 2015, pela versão americana de “O Problema dos Três Corpos”, livro este escrito em 2007. Foi o primeiro autor asiático a ganhar esse prêmio. A história do conto e do filme é muito simples. O que faz a diferença é o rigor da produção em detalhes técnicos e a competência de contar uma boa história. O filme vale a pena de ser visto pela carência de produções de ficção científica fora do circuito americano de produção. No ano de 2.500, a Terra passa por um difícil período de sobrevivência enquanto o sol fica cada vez mais perto de seu desaparecimento completo. Nesse processo ele engolirá o sistema solar em poucos anos, forçando as mentes científicas da Terra a procurarem uma solução drástica: mudar a Terra para outro sistema. Para tal, milhares de gigantescos motores foram construídos para impulsionar o planeta numa viagem de 2500 anos até seu destino final. Enquanto os humanos procuram uma nova estrela para sustentar energeticamente a Terra, uma colisão iminente com Júpiter ameaça a Terra também. Para tentar salvar a raça humana, um destemido e improvável grupo de jovens enfrenta o desafio de restabelecer a ordem e embarca em uma viagem para fora de nosso sistema solar. Essa é a proposta da operação chamada “Terra Migratória”. O filme, no entanto, começa mesmo a se desenvolver após essa introdução, pulando para uma época após 17 anos de operação, quando a Terra está se aproximando de Júpiter para usar sua gravidade como impulso para seguir viagem. Só que as coisas não saem como planejado e o gigantesco planeta gasoso começa a puxar o nosso mundo para si, causando terremotos que desligam boa parte dos motores. Daí, passamos a acompanhar dois núcleos trabalhando para o mesmo fim. O primeiro é composto pelo astronauta Lu Peiqiang (Jing Wu, do filme Lobo Guerreiro 2) e seu parceiro russo Makalov (Arkady Sharogradsky, do filme Icaria) fazendo o possível na estação espacial que acompanha a Terra em sua viagem para combater a programação do computador MOSS (já vimos essa história em outro momento, mas aqui talvez uma clara homenagem, ou inspiração do HAL 9000 de 2001: Uma Odisséia no Espaço, filme de Stanley Kubrick). O segundo é formado pelo filho de Peiqiang, Liu Qi (Chuxiao Qu, da série Bloody Romance), sua irmã Han Duoduo (Jin Mai Jaho, de Go Brother!), e um grupo de engenheiros e militares que tentam levar um novo núcleo de energia para o motor de sua cidade com o intuito de reiniciá-lo. A partir deste ponto, o filme repete a jornada comum a vários filmes sobre catástrofes, com um visual que não deve nada, no entanto, a qualquer grande blockbuster de Hollywood, com um roteiro que no início parecia bastante criativo, mas que comete os mesmos tipos de erros bobos. Com a transição entre os grupos na estação espacial e o na Terra, o longa presenteia o espectador com tomadas belíssimas que vão desde Júpiter no horizonte a veículos especiais atravessando trechos perigosos de cidades submersas e congeladas. Com efeitos especiais feitos numa parceria com a famosa Weta, a mesma responsável pela trilogia O Senhor dos Anéis. O diretor Frant Gwo mergulha sem receio e usa vários planos abertos para escancarar que os cenários são impressionantes, de fato.
O filme, por outro lado, acerta nos atores e na maneira de diluir o protagonismo entre os membros dos times. Fica claro que pai e filho têm maior peso (e o último diálogo entre eles emociona de verdade), mas os coadjuvantes têm sua função para que tudo flua. Pena que bons momentos de interação são intercalados com erros de continuidade bizarros. Mesmo que você não tenha prática de verificar continuidades e descontinuidades, é impossível não vê-las, como na cena com os capacetes, pois é tão grotesca que chama a atenção. Esse tipo de incongruência narrativa aparece em vários momentos e não dá para ignorá-los.
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AutoresGianfranco Marchi Histórico
Fevereiro 2022
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